domingo, 18 de janeiro de 2009

Cientistas recriam processo de evolução de moscas do vinagre e fazem-nas recuar no tempo


"Investigadores do Instituto Gulbenkian de Ciência (IGC), em colaboração com colegas norte-americanos, recriaram um processo de selecção natural numa população de moscas do vinagre e voltaram atrás no tempo numa experiência de reversão evolutiva. Os resultados deste trabalho, coordenado por Henrique Teotónio, responsável pelo Laboratório de Genética Evolutiva do IGC, vêm hoje publicados na edição online da revista Nature Genetics.


O estudo insere-se no caminho aberto pela teoria da evolução de Charles Darwin, descrita há 150 anos, e "demonstra uma parte dessa teoria que até agora toda a gente aceitava, mas nunca ninguém tinha confirmado do ponto de vista empírico", disse o investigador à agência Lusa. "A diferença é que quando fazemos experiências de evolução no laboratório estamos a observar a evolução a decorrer defronte dos nossos olhos, não é ir para a natureza e depois tentar inferir o que se passou", acrescentou. Henrique Teotónio e colegas da Universidade da Califórnia em Irvine usaram nestas experiências moscas de uma população selvagem de Drosophila melanogaster recolhida no Estado de Massachusetts (EUA) em 1975 e demonstraram pela primeira vez a ocorrência de um processo de selecção natural na variação genética dessa população.



Evoluções diferentes


A partir de 1980 as moscas foram mantidas em condições laboratoriais diferentes, o que fez com que mudassem de acordo com os ambientes a que foram expostas. "Mudando os ciclos de reprodução ou de sobrevivência através de condições de stress ambiental, como falta de comida ou falta de água, por exemplo, foi observado que as várias populações derivadas da original evoluíram de formas muito diferentes umas das outras", explicou o cientista.


Anos depois, em 1996, Henrique Teotónio começou a trabalhar com estas populações de moscas diferenciadas para as colocar de volta num ambiente próximo do original e estudar as suas alterações genéticas ao longo de 50 gerações, como parte do seu doutoramento na Universidade da Califórnia. "O que eu fiz foi pô-las num ambiente idêntico àquele em que foram colocadas em 1975, quando foram retiradas da natureza, a que chamamos de controlo ou ancestral" - explicou. O que aconteceu foi que, ao recuarem no tempo, "muitas voltaram ao estado ancestral, mas muitas não voltaram e fizeram-no a taxas diferentes durante as 50 gerações". As alterações foram observadas em termos de morfologia, metabolismo ou demografia, tendo esta parte do estudo sido já publicada em 2000 na revista Nature. Ao fim das 50 gerações, as moscas estavam perfeitamente adaptadas ao ambiente ancestral, e no entanto apresentavam características diferentes relativamente ao ancestral.


A variação estava lá


O trabalho agora publicado estudou a variação em sequências de DNA nestas populações e concluiu que "toda a variação genética já era preexistente, já lá estava no estado ancestral. É apenas uma mudança nas frequências relativas dessa variação genética que está por detrás da evolução das características que observámos anteriormente", sublinhou Henrique Teotónio.
A variação estava toda lá, mas, ao contrário do que se antecipava, não se registou uma reversão total ao estado ancestral em termos de frequências ao fim das 50 gerações. Segundo o investigador, "este estudo sugere que a formalização matemática da teoria evolutiva ainda é extremamente simples e como tal não preditiva". "Por definição a evolução é contingente no passado", afirmou. "O que conseguimos foi quantificar essa contingência". Henrique Teotónio, 36 anos, dedica-se plenamente à investigação no Instituto Gulbenkian de Ciência, onde além do grupo de Genética Evolutiva dirige o programa de doutoramento em Ciências da Vida."




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